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“Não tem velha e nova política. Tem política boa e política errada”

Rodrigo Maia elogiou a lealdade de Bolsonaro, mas reclamou das agressões do entorno do presidente

Em 2015, o senhor estava perto de abandonar a política. Quatro anos depois, o senhor virou uma peça-chave no xadrez da República. No Congresso, diz-se que as reformas estão em suas mãos. Como o senhor encara essa responsabilidade?
Encaro com certa aflição. Porque está se transferindo a responsabilidade pela aprovação das reformas para a pessoa que não tem essa capacidade de comandar uma base do governo. Sou a favor das reformas. Vou lutar por elas. Mas cada um na sua posição. É fundamental que o governo entenda que, apesar de ser considerado o “Senhor Reforma”, porque de fato defendo com muita energia a necessidade das reformas, isso não suprime a responsabilidade do presidente da República. Então, isso me gera alguma angústia. É óbvio que o presidente da Câmara tem o poder de pautar ou não. Eu poderia dizer: ‘não tive o apoio formal do governo, então eu não vou tratar dessa matéria. O governo é que vá cuidando’. Mas eu tenho responsabilidade. Seria um suicídio político eu ir contra o que a sociedade hoje, mesmo dividida, quer.

O governo encontra dificuldades na relação com o Congresso. Quais são as principais queixas dos parlamentares e o que o presidente Bolsonaro precisa fazer exatamente para conquistar o apoio do Parlamento?
O governo está começando. E é um governo que muda o eixo da política brasileira. Nunca governaram. Então, leva um tempo. Bolsonaro sempre foi muito crítico ao Parlamento, apesar de ser parlamentar. Então, ele precisa explicar a narrativa. Uma parte do eleitorado dele é muito radicalizada, preferia uma ruptura. Mas o presidente foi eleito de forma democrática, e é um democrata. E o Parlamento que ele tem é esse. É necessário o governo ter uma relação e compreenda que o Parlamento governa com o Executivo em todas as grandes democracias do mundo. Governar junto não significa fazer coisa errada.

O Congresso é fisiológico? Acostumou-se com o toma lá, da cá?
A possibilidade de um político indicar um nome não é um problema. O problema é quem você indica. E qual a intenção dessa pessoa. Eu não acho errado que você tenha vários generais nos Ministérios. Não tem toma-lá-dá-cá com os generais. Agora, por que a nomeação de um general é diferente da nomeação de um quadro técnico civil? O problema é a qualificação e a conduta. O que não pode é: os militares podem nomear, o entorno do presidente pode nomear, e quando um político nomeia é toma-lá-dá-cá? Toma-lá-dá-cá é quando você não constrói uma agenda política de princípios e monta uma agenda de pautas onde você vota comigo e eu te dou cargos. Aí, é toma-lá-dá-cá. O fisiologismo e o toma-lá-dá-cá vêm quando você faz uma troca. Quando você governa junto, não é fisiologismo, nem toma-lá-dá-cá.

“Em algum momento esse grupo dele vai compreender que esse estado de conflito, de idas e vindas, atrapalham mais do que ajudam a governabilidade”

O que o senhor quer dizer exatamente com “governar junto”?
Governar com uma agenda conjunta. E essa agenda tem a reforma da Previdência, a reforma tributária, a redução da pobreza no Brasil e o olhar para o País do século XXI. Como projetar o Brasil para os próximos 50 anos. Como melhorar a educação para não ficarmos atrás dos outros países em matéria de inovação e tecnologia. Tem toda uma agenda que você pode dizer: quero fazer parte dela e vou apoiar o governo desde o início. Agora, se ficar no jogo de, em cada votação libera um cargo, aí é toma-lá-dá-cá. É a política errada. Ou você acredita na política do governo ou está trocando seu voto para ter um cargo.

Quem troca voto por cargo pratica o que se convencionou chamar de “velha política”?
Não sei o que é velha ou nova política. Eu acho que a política fez muitas coisas boas. Teve o Plano Real do presidente Fernando Henrique, do presidente Itamar Franco, feito com o Congresso Nacional. A política também fez várias coisas erradas com o Lula na Petrobras. Então, não tem velha e nova política. Tem política boa e política errada.

Como fazer a sociedade entender isso com clareza? Como reverter a imagem ruim que o Congresso tem perante a população?
Acredito que, se a gente tiver coragem de enfrentar as agendas que são fundamentais, o governo assumir o protagonismo da pauta que prometeu ao seu eleitor desde o primeiro turno, a política terá condições de reverter o divórcio que aconteceu com a sociedade ao longo dos últimos anos. Lembro que, quando eu era menino, ser deputado era uma coisa relevante. Ao longo do tempo, foi se tornando uma coisa irrelevante e às vezes até negativa. Mas se recuperarmos a economia e voltarmos a gerar empregos tiramos da sociedade muito dessa relação amarga que tem com a política.

Se o senhor precisasse apontar três qualidades e três defeitos do presidente Bolsonaro, quais seriam?
Não gosto de falar de defeitos. Acho que o Bolsonaro é um cara de palavra. E muito leal ao núcleo que lhe deu a oportunidade de disputar com chances a eleição. Aquele grupo que o levou aos primeiros 15%. Lealdade é uma coisa muito importante.

As arestas com o presidente foram definitivamente aparadas?
Quando você faz uma crítica ao governo, aqueles das redes sociais do entorno do presidente são muito agressivos. Não dá para você ser aliado e o entorno do presidente concentrar agressões a você. Tem muitos adversários do presidente, muitos que não querem a reforma da Previdência, que não querem que o governo dê certo, que poderiam ter o foco deles. O problema é que eles viram as armas contra os próprios possíveis aliados do governo. Então, isso certamente gera um incômodo. Por isso eu disse: estou querendo ajudar, mas eu não posso estar remando para um lado e o entorno do presidente me empurrando para outro lado.

Então o problema é com o entorno do presidente, não mais com ele?
Olha, se a gente ficar focando nossas energias em conflitos e interpretações de posições, a gente vai passando para a sociedade a ideia de que estamos mais preocupados com isso do que com a possibilidade de construir esse novo ciclo da política brasileira. A gente tem convergências, divergências, mas, graças a Deus, nós vivemos numa democracia onde temos o direito de divergir. O que a gente não tem é o direito de colocar eventuais divergências à frente da pauta de reformas que o Brasil precisa aprovar nos próximos meses.

O senhor acha que essa predileção pelas mensagens via redes sociais têm atrapalhado as relações políticas?
Todos esses movimentos que ocorreram no mundo nos últimos anos, muito ligados às redes sociais, têm complicações. Muito radicalizados, eles estão preparados para tirar algo do lugar. Operam pela ruptura. Mas eu acho que num determinado momento essas coisas vão se estabilizar. Em algum momento esse grupo dele vai compreender que esse estado de conflito, essas idas e vindas, atrapalham mais do que ajudam na governabilidade do Brasil.

O senhor continua acreditando que a reforma da Previdência será aprovada neste semestre?
Acho que aprovaremos a reforma da Previdência nesse semestre. Tem muito apoio. Mais que no ano passado. Muitos parlamentares convencidos de que tem que votar. Muitos deputados impactados com a necessidade. Muitos políticos inclusive de centro-esquerda. Tirando o Benefício de Prestação Continuada (BPC) e a aposentadoria rural, que são temas que não têm muita perda fiscal, nós temos muita chance de aprovar uma boa reforma, que garanta uma boa economia para o governo federal. A articulação do governo está começando a melhorar. Da semana passada para cá, começou a melhorar.

“Os militares podem nomear, o entorno do presidente pode nomear, mas quando o político nomeia é toma lá, da cá? O problema é quem você indica e qual a intenção”

Quem está ajudando a melhorar?
O Onyx Lorenzoni, o Paulo Guedes…

Como o senhor avalia o papel dos militares que estão no governo?
São pessoas qualificadas. Afinal, ninguém chega a general quatro estrelas sem um grande mérito, preparo e experiência. Então, quando assumem uma missão no campo civil, também vão muito bem. Acho que há um grupo que até esperava ter uma influência maior sobre o presidente Bolsonaro. Mas nem os militares nem o ministro Paulo Guedes (da Economia) têm a influência que imaginavam ter no governo Bolsonaro. Esse núcleo inicial, que gerou os primeiros 15%, influencia mais a cabeça do presidente.

O senhor também está matando no peito esse tema da reforma tributária, sempre muito polêmica. Existe ambiente para aprová-la?
O sistema tributário está falido. Ele é ineficiente, é caro, burocrático, prejudica o setor privado a investir, o custo é muito alto, é um sistema com muitas leis, muito complexo. Está na hora de tratar desse tema também. Sinalizamos qual é a proposta que vai tramitar na Câmara, a do Bernardo Appy, que prevê a criação do IVA. Estamos aguardando a proposta do governo.

E o projeto anticrime do ministro Sergio Moro?
É um projeto de lei. Anda mais rápido. Estamos com o grupo de trabalho atuante com 12 deputados. Vão trabalhar por 40 dias e entregar aos partidos para que a gente decida se vamos criar alguma Comissão Especial ou se vai direto para o plenário.

//istoé