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Maioridade penal: algumas falácias

Numa petição em favor da redução da maioridade penal que circula na internet são feitas várias afirmações falsas. A mais notável é que existe uma tendência mundial a diminuir a idade penal, e que a maior parte dos países tem um limiar menor que o Brasil.

Alguns bacharéis dizem que a idade penal é fixada mais alta nos países atrasados que nos países desenvolvidos, e que a idade de 18 anos não corresponde ao atual Brasil desenvolvido(?), pois foi inventada nos anos 40 para o Brasil não desenvolvido.

Porém, os atuais propugnadores da “PEC/33/2012” silenciam o fato de que no Brasil, como em quase todos os países, há duas idades diferentes de responsabilidade penal.

Uma é a idade em que o infrator é plenamente imputável; isso significa: ele/ela pode ser julgado(a) por qualquer tribunal competente, e pode receber qualquer pena determinada em lei.

Outra é a idade a partir da qual o infrator, mesmo não podendo ser imputado totalmente, pode ser detido, condenado a uma pena “especial” e recluído em um tipo de prisão especial. No Brasil, essas prisões especiais se chamam com o sarcástico nome de “estabelecimentos educativos”.

O fato que mais ocultam os defensores da redução da idade penal é que este segunda limite para a punibilidade parcial é, no Brasil, de apenas 12 anos e não de 18.

Então, falar que um jovem entre 12 e 18 anos fica impune é uma mentira deslavada e torpe que qualquer criança que saiba ler poderia refutar olhando a Lei nº 8.069/90.

Está, em seu artigo 121, § 5º, autoriza o juiz de menores a aplicar ao adolescente (entre 12 e 18 anos de idade) internação em “estabelecimento educacional”, que, tirando o cinismo do eufemismo, significa prisão especial para jovens. Esta prisão é tão especial que, em outubro de 1999, a opinião pública internacional se estremeceu pela barbárie dos procedimentos da Febem Imigrantes, e o então presidente do TJSP, o desembargador Márcio Bonilha, publicou um panfleto ameaçando as ONGs internacionais que denunciaram o caso em 12/07/2000 por “violar a privacidade dos menores” (sic!!!). Ele só não disse que todo menor tem direito a ser morto e torturado em privado, sem notícias despudoradas.

A punição para menores pode ser mais dura que a dos adultos, pois este, ao ser julgado pelo juiz, tem direito, teoricamente, a um advogado, o qual geralmente consegue melhores condições para o réu, salvo que este tenha a má idéia de ser negro ou indigente. Quem mandou cometer crime sem antes fazer fortuna?

No caso da internação na ex-Febem (ou como se chame atualmente), o agente jurídico decide com absoluto arbítrio. É relevante (porém, não surpreendente) que nesta abundante discussão sobre a maioridade não se mencione este fato!

Um truque muito comum nos propugnadores da PEC em apreço consiste em comparar a idade de punibilidade plena no Brasil (18 anos) com a idade de punibilidade parcial em outros países.

Ou seja, quando se referem ao Brasil, mostram a idade de punibilidade máxima: 18 anos. Quando se referem a outros países, mostram a idade de punibilidade mínima, que geralmente é de 12, 14 ou 16 anos – salvo no Reino Unido e na Suíça, onde é de dez anos.

Então, eles comparam e dizem:

–  “Estão vendo? 18 é maior que 12, que 14 e que 16”. Portanto, o Brasil é mais leniente com os criminosos juvenis que outros países.

Na Itália, na Áustria, na Alemanha e na maioria dos países da Europa ocidental, salvo o Reino Unido e a Suíça, a idade mínima de punibilidade parcial é de 14 anos ou mais, ou seja, dois anos a mais que no Brasil. Já nos países escandinavos, que são os que possuem o menor índice de criminalidade per capita do planeta, essa idade é de 15 anos.

Na maioria dos países civilizados, a punibilidade total tem como limite 18 anos, como no Brasil, ou ainda maior. Na Alemanha, um jovem pode ser julgado num tribunal normal e receber penas comuns a partir dos 18 anos, porém, se ele tiver menos de 24, uma equipe de especialistas deverá avaliar seu grau de maturidade emocional. Observe que isto não é o mesmo que o exame psiquiátrico do réu. É uma rotina para todo réu juvenil. Vide.

Isso não acontece nos Estados Unidos, onde o limite pode ser até de 7 anos, mas já houve várias elevações da idade mínima em alguns estados, e o movimento em prol disso continua.

Também na Austrália a idade de imputabilidade total é de 18 anos, salvo apenas no estado de Queensland, onde é de 17 anos.
Outra falácia que veio robustecer os falsos argumentos dos linchadores é a de que nos países subdesenvolvidos a maioridade penal é maior que nos países desenvolvidos. Olhemos estas maioridades penais, e pensemos quão desenvolvidos são estes países:

Por sinal, observe que quase todos esses países são teocracias, uma forma de governo que já foi (teoricamente) extinta no Ocidente.

Já Angola, apesar de ser um país devastado pelas guerras, e com o qual o Brasil mantém certa relação de “paternalismo”, tem um limite maior que o Brasil para punibilidade parcial: 16 anos.

Uma mentira bastante torpe é que há uma tendência mundial a diminuir a maioridade penal. O que ocorre, na verdade, é o contrário. Tanto as organizações mundiais como grupos não-governamentais e a própria legislação internacional apontam para uma moderação do sistema de linchamento de jovens patrocinado pelo Estado.

Um artigo ilustrativo, baseado em fontes verificáveis, pode ser lido aqui.

Como exemplo, a Dinamarca tinha até há pouco tempo o limite de punibilidade parcial em 14 anos e o aumentou para 15.

No Reino Unido também se estuda a necessidade de elevar esse limite. Veja.

Quanto aos aspectos acadêmicos e científicos do assunto, a BBC tem difundido recentemente (vide) estudos fundamentados de neurocientistas que mostram que a capacidade de tomar decisões continua se desenvolvendo durante toda a adolescência e boa parte da juventude.

Esse dado, considerado incontrovertível há bastante tempo, está influenciando na elevação no limite de imputabilidade. Isso está acontecendo nos países civilizados, onde os governos preferem guiar-se pela ciência e não pela superstição.

Este ponto é importante, porque surpreende a invejável auto-estima dos especialistas em generalidades, que aduzem supostos avanços “científicos” que provariam que uma criança já é responsável de suas ações desde cedo. Meus colegas cientistas não conhecem esses dados, e vou aconselhá-los a se aperfeiçoarem nas faculdades de Direito e Comunicação.

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