Bahia Eleições

Idosos são 20% do eleitorado baiano e políticos tentam convencê-los a votar

Pessoas com mais de 70, que não são obrigadas a comparecer às urnas, têm sido disputadas por candidatos

Em Maetinga, no sudoeste baiano, as eleições são um grande — senão o maior — evento local. As carreatas movimentam os moradores, que se dividem, nesta época, em lados partidários opostos. Com a expectativa de uma alta abstenção devido à pandemia, cresceu a disputa dos candidatos por um perfil específico: idosos com mais de 70 anos que não são obrigados a votar.

Como cada voto decide uma eleição – principalmente em municípios menores -, ficaram mais intensas as propostas para convencer quem não precisa ir às urnas a escolher um candidato. Na Bahia, ao menos 9% do eleitorado, formado  por 10,8 milhões de pessoas, tem mais de 70 anos e não precisa votar. Outros 11% têm entre 60 e 69 anos. Ou seja, quase 20% do eleitorado é idoso.

Na cidade, vivem 2,5 mil habitantes, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mas 7 mil pessoas têm título eleitoral registrado no local. Entre o eleitorado, quase dois em cada 10  –  que representam 16% – têm, como Dona Neuza, mais de 70 anos. E segundo o artigo 14 da Constituição Federal, eles só votam se quiserem. Sem diferenciação por idade, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) projeta uma abstenção superior a 30%, um aumento de 10%  comparado a eleições anteriores. A corrida para conquistar os idosos faz sentido.

O Tribunal Regional Eleitoral da Bahia (TRE-BA) não faz nenhuma projeção de abstenção, mas acredita em um aumento, sobretudo entre os grupos de risco para a covid-19. A aposentada Neuza conta que pretende votar,  “porque é um exercício de  cidadania”. Semanalmente, candidatos aparecem na janela da sua casa e tentam conquistar seu voto. Eles não são convidados a entrar, por medo do  coronavírus, que infectou 66 vizinhos.

Dona Neuza  calcula que cinco candidatos a vereador citaram o fato de ela ser idosa, em um município com muitos como ela, e que seu voto poderia definir resultados. Ela sabe disso. As agendas desses políticos, por outro lado, não necessariamente dialogam com esse grupo de pessoas.  “Um candidato conversou comigo e disse que sabia que eu não tinha obrigação de ir votar, mas que seria bom”, diz.

A conquista
Nas eleições municipais de 2016, 53% das pessoas com idades entre 70 e 79 anos, mesmo sem exigência, foram às urnas. Entre os maiores de 80 anos,  17% compareceram. Já, entre os menores de 18 anos, também sem necessidade de votar e que representam 1% do eleitorado, a média de comparecimento foi de 83%.

Os idosos são do grupo de risco para o coronavírus e podem justificar a ausência, se não se sentirem seguros, de forma remota. Isso pode ser feito a partir desta segunda-feira (16), o que potencializa artimanhas e insistências dos políticos para conseguir seus votos. Nestas eleições, os idosos terão prioridade para votar, entre às 7h e 10h.

A candidata a vereadora em Maetinga, Fernanda Dultra Aguiar, explica que um dos processos, na tentativa de conseguir o voto da parcela mais velha da população, é ensinar métodos de segurança na hora de ir votar e mostrar “que, sim, é seguro”.

As campanhas, avalia Waneska, tiveram que se adaptar para conseguir o voto mais velho. Isso também intensifica a campanha “cara a cara, de convencimento mesmo”. Sem as mesmas estratégias de comunicação digital encontradas em metrópoles, o fenômeno é mais intenso no interior, o que pode até ser benéfico. “Acredito que a democracia ganha nesse processo de competição eleitoral, de resgatar a ideia de convencer a ir votar”, comenta a cientista política.

Há, também, que se considerar até onde essa conquista pode ir e quais os limites que a diferenciam de um crime. Uma moradora de Esplanada, no Nordeste da Bahia, relata que tem acompanhado candidatos a prefeito e vereador oferecer carona a idosos, em troca de votos. “Eles insistem para os mais idosos irem votar, seja longe como for”, diz. Na cidade,  onde vivem 37 mil pessoas,  8% dos eleitores têm mais de 70 anos.

Qualquer oferecimento de favor em troca de voto é considerado crime eleitoral, explica o analista judiciário do TRE e professor da Ufba, Jaime Barreiros. O convencimento faz parte da política.  Já, “oferecer transporte é uma vantagem indevida e pode caracterizar a popular compra de votos”, dispara .

Os candidatos podem ser denunciados via ouvidoria do TRE ou no Ministério Público Eleitoral.” E se o candidato for condenado por compra de voto, pode ser caçado e ficar oito anos sem disputar”, ressalta. Ainda não há nenhum levantamento sobre aumento ou diminuição de crimes eleitorais na prévia das eleições.

Apesar de acreditar em um crescimento de abstenção entre os mais velhos, Jaime observa um entusiasmo nesta faixa do eleitorado.  “Vemos um interesse dos mais idosos em votar, porque eles viveram momentos  de muita restrição da cidadania como a Ditadura, por exemplo”, avalia.

Personalismo
Em Ribeira do Amparo, candidatos já perderam por três, quatro, dez votos, lembra a aposentada Josefa Ferreira Costa, 85. No mercadinho do marido, um e outro político passa tentando convencê-la a ir votar – e em quem votar.

Dos parentes de Josefa, quase todos são políticos, entre filhos e genros. “Eu mesma, se não fosse agora esse genro, nem ia votar”, conta. As relações familiares e de amizades fazem diferença nas cidades do interior, onde o voto é visto como sinônimo de lealdade. Por lá, moradores se agitam para defender este ou aquele candidato, o que, na maioria das vezes, significa defender este ou aquele poderoso que sempre imperou na região.

Domingo eles não vão
Esta será a primeira vez que Augusto César Ribeiro de Azevedo, 73 anos, não irá votar. Idoso e hipertenso, vive recluso, em quarentena,  em uma pequena chácara no bairro de Pernambués. De casa,  avista frestas do mundo exterior, do qual se isolou em  março.

Uma distância de 50 metros separa Augusto da sua seção – um colégio público do bairro. Para ele, as eleições sempre foram um momento de exercer um direito e cumprir uma tradição, já que,  depois de votar, encontrava os amigos para uma resenha no bar. “Há algo maior agora, que é a minha saúde”, reflete.

Em Muritiba, no Recôncavo Baiano, Joana Caribé, 71, chegou a compartilhar um texto pedindo que nenhum candidato aparecesse em sua casa para apresentar propostas. Em isolamento com a filha e o neto, ela não quer quebrar as restrições para ir votar, ainda que tenha o participado das eleições durante toda a vida, como um ato pela democracia.

“É uma questão de escolha não ir votar, para me prevenir. Uma pena, porque sempre gostei de ir”, conta ela, que torce, como todos os outros, por um novo cenário no próximo pleito eleitoral.