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Caso Jéssica: o enredo do feminicídio

Américo e Jéssica, segundo familiares da jovem, eram namorados

Américo e Jéssica, segundo familiares da jovem, eram namorados, mas ele nega

Por Fábio Sena

A estudante Jéssica Nascimento, 22 anos, foi vítima de uma brutal agressão: espancada com chutes e socos dentro de sua própria residência, no Bairro Brasil, pelo suposto namorado, o estudante de Engenharia Américo Francisco Vínias Neto, de 24 anos, ela faleceu na tarde desta terça-feira, 10, depois de duas semanas internada em uma Unidade de Terapia Intensiva/UTI do Hospital de Base de Vitória da Conquista. O assunto ganhou repercussão nacional. O Código Penal estipula a pena de reclusão de 12 a 30 anos para o homicídio contra a mulher por razões da condição de sexo feminino (feminicídio). Atualmente, já existe agravante no caso de crime cometido contra vítima menor de 14 anos, maior de 60 anos ou com deficiência; durante a gestação ou nos três meses posteriores ao parto; e na presença de descendente ou de ascendente da vítima. A tipificação do feminicídio, assassinato de mulheres em razão do gênero, foi sancionada há um ano.

CONHEÇA OS EPISÓDIOS:

EPISÓDIO 1. No dia 25 de Abril, a imprensa local noticia o fato de uma jovem, “supostamente grávida”, haver sido internada em estado grave no Hospital de Base de Vitória da Conquista após ser “agredida”. E arremata que a polícia iniciara as investigações sobre o caso. Trata-se de Jéssica do Nascimento, 22 anos de idade, natural de Itapetinga, residente no Bairro Brasil, em Vitória da Conquista. Mãe de um filho, ela estava grávida de quatro meses. Em coma induzido, Jéssica ficou na ‘sala de choque’ aguardando uma vaga na UTI da unidade hospitalar. As primeiras informações dão conta de que não havia risco de morte. O Serviço Social do hospital ainda não sabia informar se as agressões teriam afetado a gestação. A agressão aconteceu na casa da vítima, onde era realizada uma festa. Cinco pessoas, além de Jéssica e Américo, estavam no local, dentre eles um amigo que mora com a jovem.

EPISÓDIO 2: Ainda no dia 25 de Abril, a Polícia Civil prende em flagrante o homem acusado de ter espancado a jovem Jéssica Nascimento. Trata-se de Américo Francisco Vinhas Neto, de 24 anos, estudante de Engenharia. Ele seria, segundo as primeiras notícias daquele dia, namorado de Jéssica Nascimento. A titular da Delegacia Especial de Atendimento à Mulher/DEAM, delegada Decimara Gonçalves, informou à imprensa que o agressor teria sido ouvido pelo delegado plantonista e liberado após pagamento de fiança. A delegada informou ainda que, embora não tivesse acompanhado o depoimento do acusado, tinha ouvido os relatos da família de Jéssica sobre o espancamento. Américo Francisco foi solto mediante pagamento de fiança de cerca de R$ 5 mil. O delegado de Polícia Civil teria configurado o caso como violência doméstica, entendendo que a situação era afiançável.

EPISÓDIO 3: No dia 26 de Abril, a titular da Delegacia Especial de Atendimento à Mulher/DEAM, delegada Decimara Gonçalves, informa que solicitaria do Hospital Geral de Vitória da Conquista relatório médico para saber a gravidade das agressões e em quais locais elas ocorreram.

EPISÓDIO 4: No dia 30 de Abril, Jéssica Nascimento foi submetida a uma cirurgia para retirada do feto. Na ocasião foi colhido material genético do bebê para exame de DNA e posterior comparação com material colhido do suspeito da agressão.

EPISÓDIO 5: No dia 3 de Maio, um novo depoimento ao delegado Gustavo Tortorelli, do Plantão Central da Delegacia de Vitória da Conquista, Américo Vinhas Neto afirmou “não se lembrar de nada”. Na ocasião, foi colhido material genético do jovem para realização do exame de DNA que revelaria se a criança que Jéssica esperava era filha dele. Em seu depoimento, Américo Vinhas Neto negou que mantinha um relacionamento amoroso com a vítima e relatou ter feito uso de drogas e bebida alcoólica no dia da agressão. Assegurou desconhecer o fato de que a jovem estava grávida. “Ele não nega nem confirma [a agressão]. Diz que não lembra, porque usou muita droga. Ele disse que usou maconha, cocaína e um alucinógeno conhecido como MD. Todos que estavam na festa estavam usando drogas”, detalhou o delegado. Testemunhas ouvidas pelo delegado confirmaram as agressões. Afirmaram que tentaram impedir Américo, mas não conseguiram. Foram eles que chamaram a Polícia Militar. No momento da agressão, estavam na casa dois casais e um homem, que é amigo de Jéssica. As investigações apontaram que Jéssica e Américo se conheciam há pouco tempo. Ele informou que a havia encontrado apenas duas vezes. No dia 10 de abril e na madrugada do dia 25 [dia do crime]. As testemunhas confirmaram essa versão.  Mas a versão da família era diferente. Apontaram o suspeito como namorado de Jéssica.

EPISÓDIO 6: No dia 4 de Maio, Jéssica Nascimento permanece internada no Hospital de Base de Vitória da Conquista, em coma induzido. Respira com a ajuda de aparelhos. O estado dela é grave. O laudo médico enviado pela unidade médica à delegacia aponta que a paciente deu entrada na unidade com traumatismo craniano grave e hematomas em várias partes do corpo. O Delegado Gustavo Tortorelli solicita à Justiça que decrete a Prisão Preventiva do acusado de agressão.

EPISÓDIO 7: No dia 5 de maio, a Juíza de Direito Juliane Nogueira Santana Rios, da Vara da Violência Contra a Mulher, atendendo à solicitação do Delegado Gustavo Tortorelli, decreta a Prisão Preventiva de Américo Francisco Vinhas Neto.

EPISÓDIO 8: Agentes da Polícia Civil vão à casa do suspeito no final da tarde da sexta-feira (5), mas ele não foi localizado. Aos policiais, conforme informou Tortorelli, foi dito que Américo não estava em casa e que não se sabia do paradeiro dele.

EPISÓDIO 9: O advogado de Américo Vinhas Neto, Dr. Gutemberg Macedo, em entrevista à imprensa local, por não enxergar legalidade no pedido de prisão do cliente, informa que entraria com o pedido de habeas corpus. Informa, ainda, que Américo não se entregaria à polícia até que o Tribunal de Justiça da Bahia emitisse uma decisão sobre a legalidade do pedido de prisão preventiva.

EPISÓDIO 10: No dia 7 de Maio, blogs repercutem a informação segundo a qual Jéssica estaria em franca recuperação de saúde. A informação teria sido confirmada por profissionais de saúde da UTI do Hospital Regional de Vitória da Conquista: os sedativos que mantinham Jéssica em coma teriam sido retirados, havendo “respostas surpreendentes”. Alentava-se a esperança, então, de que, mantida a evolução do quadro clínico, a jovem deixaria a unidade de terapia intensiva em poucos dias, para ser encaminhada ao Serviço de Psicologia do Hospital de Base e ser comunicada sobre a perda do filho.

EPISÓDIO 11: No dia 9 de Maio, novas notícias dão conta de complicações no quadro clínico de Jéssica Nascimento. Seu estado de saúde agora é considerado gravíssimo. Depois de sofrer uma parada cardiorrespiratória, ela foi reanimada pela equipe médica da UTI do Hospital Regional de Vitória da Conquista. Aos familiares, foi informado que os rins e os pulmões de Jéssica já não estavam funcionando. Por causa da insuficiência renal, ela deveria ser submetida a procedimento de hemodiálise.

EPISÓDIO 12: No dia 10 de Maio, Jeane Augusta Silva, mãe de Jéssica Nascimento, revela à imprensa que a filha “está toda deformada” e que, ao entrar na UTI, não conseguiu aproximar-se dela. “Quando eu vi aquela cena, eu saí num desespero, chorando, com medo de perder a minha filha”.

EPISÓDIO 13: Uma tia de Jéssica Nascimento informa que a família teria sido desenganada quanto à jovem. Falência múltipla de órgãos. Uma nefrologista seguiu para o Hospital de Base para avaliar se ainda valia a pena realizar hemodiálise para filtrar os valores de ureia e creatinina. Jéssica já havia sido diagnosticada com uma bactéria no sangue.

EPISÓDIO 14: A jovem Jéssica Nascimento morreu na tarde desta terça-feira, dia 10 de Maio, acometida de uma infecção bacteriana e também por causa do traumatismo craniano sofrido em meio às agressões do estudante de engenharia civil, Américo Vinhas Neto, no dia 25 de abril.